... é o apelido que nós damos à toda pessoa que está cursando uma pós-graduação e tem um orientador de dissertação, tese ou TCC que não "funciona" isto é, está sempre ocupado demais, doente demais, sem tempo demais e nunca lê o texto que o pesquisador enviou. Quando devolve o texto com 10.000 anotações de correção, faltam 24 horas para finalizar seu prazo e você pira! O orientador deixa o orientando à deriva e este sofredor ganha o apelido de "desorientando".
Acontece outro caso também. O da pessoa que passou muito tempo fora da academia e precisa retornar para cursar uma especialização. Ela participa de processos seletivos e fica reprovada em todos. No ano seguinte ela resolve separar um tempo na agenda para ser aluna presencial ouvinte em algum na pós para ir se familiarizando com o programa onde deseja cursar. Comparece às aulas semanalmente, entrega todos os trabalhos e participa de tudo. Depois de um ou dois anos neste sufoco, ela faz o processo seletivo e novamente não passa. Geralmente não passa "por pouco". Mas esse "por pouco" é de matar!
Você já passou por isso? Eu já. E não foi uma nem duas vezes. Foram 10 vezes ao longo de 8 anos.
Como professora universitária que sou há 21 anos, eu tenho o trânsito de professora e de aluna dentro de instituições de ensino, isso me faz observar algumas coisas. Minha ideia neste e nos próximos textos é compartilhar um pouco desta experiência com você que está frustrado com sua recolocação profissional depois de formado.
Eu me formei em administração em 1991. Em 1998 fui convidada a lecionar numa instituição de ensino superior. Minhas disciplinas seriam ligadas à Antropologia por conta de um trainee no exterior que eu fizera no ano da minha formatura na área de adaptação transcultural nesta grande aldeia global. Hoje este programa poderia bem ser chamado de Estudos Globais. Mas não existia nada similar naquela época. Ainda mais em 1991 quando a internet era conexão discada e só era acessível às empresas. Raras eram as residências que possuíam este privilégio. Observei que precisava me especializar para ser uma boa professora naquela área (diferente daquela onde me formei).
Ao realizar o processo seletivo para o mestrado numa instituição privada (2000), eu passei em primeiro lugar empatada com outras duas candidatas. Achei estranho porque eu não era formada naquela área, estava sem estudar há 8 anos e todos os demais candidatos eram formados na mesma casa e no mesmo curso.
Isso me fez ter uma impressão que "eu era muito boa" naquilo. Anos mais tarde fui compreender que a instituição precisava de alunos e tinha tendência de reprovar somente gente muito deficiente em leitura e escrita, mas continuava o enigma, por quê uma classificação tão alta? Bom a primeira coisa importante a aprender aqui é não ter um conceito sobre si acima da realidade. Autoestima top é sempre bom, mas narcisismo top é perigoso para a carreira de qualquer pessoa.
Na Filosofia a capacidade argumentativa de um texto é bem importante. E tanto eu quanto as duas colegas empatadas em primeiro lugar éramos as únicas mulheres de todo o processo seletivo (que deveria ter uns 50 candidatos) e nossos textos eram muito bons. Mas num ambiente masculino isso gera alguns ressentimentos. Lembro que o diretor do programa comentou sobre nosso empate em primeiro lugar na aula inaugural, em tom de ironia dizendo "não sei se o primeiro lugar delas significa que elas são muito boas ou que os alunos formados na casa são bem piores do que pensam".
Claro que havia toda uma questão machista neste comentário, que não é o foco da minha reflexão aqui. O fato é que nenhuma das três candidatas era formada naquela área de especialização, no entanto o desempenho delas no processo seletivo foi superior a todos os outros que eram graduados naquela área. Isso deixou algumas pessoas ressentidas, a começar pelo tal diretor.
Então primeiras coisas que a gente aprende aqui:
- Se você se sair muito bem num processo. Não fique se gabando ou se achando o tal. Lembre que existe muita gente ressentida em posição de poder que pode se enfiar no caminho para tentar atrasar o seu progresso. Seja discreto, segure a onda no nível da humildade. Celebre sua vitória, mas não pense que ela é garantia certa de vitória nas próximas etapas.
- Se você não tem intenção de dedicar-se à docência no ensino superior, não procure por um mestrado acadêmico. Procure um mestrado profissional ou um MBA na área na qual deseja se especializar, preferencialmente extensão da sua área de formação. Mestrados acadêmicos são formação obrigatória para professores do ensino superior, a finalidade é formar um professor universitário. Mestrados profissionais formam gente ligada à docência fundamental e média e especialistas para outras áreas de conhecimento que não sejam necessariamente ligadas à docência. Dependendo do curso, um MBA pode ser muito mais vantajoso que qualquer mestrado ou doutorado.
- Ao contrário do que os meus alunos recém-graduados pensam (fazer um mestrado para melhorar o currículo), isso é verdade, mas apenas em parte e para certos segmentos, como por exemplo, a docência superior. Ter um MBA no âmbito corporativo é muito mais vantajoso, por conta da formação assertiva numa área prática. Os mestrados profissionais são mais valorizados no ambiente corporativo pelo mesmo motivo: formação prática. Nos dias em que vivemos, muitas empresas preferem contratar um profissional menos qualificado academicamente, porém mais experiente profissionalmente e mais barato do que alguém com diploma de mestrado que não tem experiência. Há títulos que ficam ociosos no nosso currículo e não servem para nada, nem ajudam a arrumar emprego, ao contrário, acabam atrapalhando.
- Ao terminar a graduação: procure trabalho! Sério! Experiência profissional conta mais do que muitos diplomas. Pular da graduação para a pós 1, pós 2, pós 3, etc sem nunca ter trabalhado sequer como vendedor de uma loja é péssimo para a carreira de qualquer pessoa. Até para os que querem exercer docência superior. Nestes 35 anos de carreira e 21 na docência superior eu cansei de ver gente que saiu da graduação, pulou para mestrado, depois para doutorado, com 25 anos de idade já era doutor. Em compensação era péssimo educador. Não sabia dar aula. Suas aulas pareciam apresentação de seminário de pós, feita para uma meia dúzia de ouvintes sendo um dos quais um professor exigente. Dar uma boa aula é muito diferente de apresentar um seminário na pós, exige capacidade de se comunicar com seus alunos, seu público, gerar empatia, fascinar os alunos. Sem isso a aula do sujeito é um xarope. Terminou uma graduação ou licenciatura, pegue empregos particulares para dar aula. Terminou um mestrado, se ainda não tem experiência de classe, vá lecionar, antes de procurar um doutorado.
- Se você está procurando especializar-se numa área diferente daquela que se formou tenha certeza dos motivos certos pelos quais está fazendo isso. Muita gente se forma e não consegue trabalhar na área que se formou, fica infeliz e resolve fazer um mestrado numa área diferente para ver se dá certo. Mestrado não é o mesmo que uma segunda graduação! Talvez seja mais vantajoso você fazer uma outra graduação em menos tempo aproveitando créditos da primeira.
- Doutorado não forma professores bons, doutorado forma pesquisador. Nem todo mundo precisa fazer uma carreira chegando ao doutorado. Para professores do ensino superior esta é uma via indispensável, para outras carreiras dificilmente um doutorado valorizará mais sua experiência profissional.
Na próxima semana eu continuo contando esta história longa...
Grande braço e sucesso!
Lília
Lília Marianno é administradora, educadora, empresária, palestrante e consultora.
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